O Engenho de Zé Lins
Documentário - 85 min.
Direção: Vladimir Carvalho
Sinopse: Intercalando depoimentos de amigos como Rachel de Queiroz e Tiago de Melo, e mais Ariano Suassuna, Carlos Heitor Cony, Sávio Rolim (o ator que viveu o menino de engenho no filme homônimo de Walter Lima Jr.), e sobreviventes da decadência dos engenhos, o filme revela a extrovertida e sensível alma de José Lins do Rego, até hoje injustiçado pela crítica e pelas editoras.
No Colégio Estadual José Lins do Rêgo, em Pilar, cidade natal do escritor, os alunos não sabem quem foi José Lins, que nasceu em 3 de junho de 1901, e nunca leram um de seus livros.
Zé Lins retratou o universo onde cresceu em "Menino de Engenho" (1932), e em outros de seus livros com temática ligada ao ciclo da cana-de-açúcar, até sua maturidade. O "Engenho de Zé Lins" recupera o único registro em áudio do autor (uma entrevista a uma rádio portuguesa em 1956), intercala imagens do filme de Walter Lima Jr., lembra a história pouco conhecida do assassinato acidental de um amigo pelo autor, e o caso afetivo e de grande amizade entre ele e Gilberto Freyre, que acreditava ser seu mentor intelectual. E ainda há os momentos impagáveis do flamenguista fanático tirando sarro com os amigos no Maracanã, e outros emocionantes, como a lembrança do autor internado, a receber visitas de anônimos torcedores do rubro-negro que queriam se despedir de um dos mais fervorosos deles.
José Lins do Rego morreu de cirrose hepática por complicações de esquistossomose, aos 56 anos, no Rio de Janeiro, em 12 de setembro de 1957.
UM AMOR JOVEM
(The Hottest State, EUA, 2006)
Direção: Ethan Hawke
Elenco: Mark Webber, Catalina Sandino Moreno, Michelle Williams, Jesse Harris, Laura Linney, Frank Whaley, Lynn Cohen, Greta Gaines, Nick McDonnel, Alexandra Daddario, Iraida Polanco, Sônia Braga, Anne Clarke, Ethan Hawke, Matt Jade, Cherami Leigh, Elizabeth Marley
Sinopse: Adaptado por Ethan Hawke de seu próprio romance homônimo, Um Amor Jovem é uma história agridoce que destila a alegria, a dor, os auges eróticos e os baixos emocionais do primeiro amor. Dias antes de completar 21 anos, William, um ator, conhece e de imediato fica perdidamente apaixonado por Sara. O filme viaja com William de um apartamento vizinho no Lower East Side nova-iorquino a um quarto de hotel mexicano, para um final de semana de muita neve em Connecticut até o retorno ao lar no Estado mais quente de todos, Texas, sempre à caça de Sara. Sua obstinação e doce inocência na busca por alguém que o ame tanto quanto ele a ama podem não ter um final feliz, mas com certeza levam a uma maturidade inédita. Além do próprio Hawke, a atriz brasileira Sonia Braga também participa do elenco de apoio.
Notas da Crítica:
Carlos Eduardo Corrales, Delfos: 5/5
Camie Guimarães, Omelete: 4/5
Cassio Starling Carlos, Folha Ilustrada: 3/4
Alysson Oliveira, Cineweb: 3/5
Daniel Schenker, Contracampo: 2/4
Bruno Amato Reame, Paisà: 2/5
Gilberto Silva Jr., Contracampo: 1/4
Luiz Carlos Oliveira Jr., ContracampO: 1/4
GIGANTE – COMO O INTER CONQUISTOU O MUNDO
(Brasil, 2007)
Direção: Gustavo Spolidoro
Sinopse: A mais gloriosa jornada do Colorado. Aqui estão os lances principais das duas partidas do time no Japão, os magníficos gols dos meninos Pato e Luiz Adriano e de Adriano Gabiru, mais os depoimentos dos heróis do título. Reportagens feitas no calor da hora, imagens dos bastidores e da volta a Porto Alegre, sem esquecer a Libertadores, que comprou a passagem para Tóquio.
Notas da Crítica:
Alysson Oiveira, Cineweb: 3/5
A MALDIÇÃO DA FLOR DOURADA
(Man cheng jin dai huang jin jia, China/Hong Kong, 2006)
Direção: Zhang Yimou
Elenco: Chow Yun-Fat(Imperador Ping), Gong Li (Imperatriz Phoenix), Jay Chou (Príncipe Jai), Liu Ye (Príncipe Wan), Ni Dahong (Médico imperial Jiang), Qin Junjie (Príncipe Yu), Li Man (Chan Jiang), Chen Jin (Sra. Jiang) .
Sinopse: China, última dinastia Tang, século X. Flores douradas enchem o palácio imperial na noite do festival Chong Tang. O imperador Ping (Chow Yun-Fat) retorna inesperadamente com seu 2º filho, o príncipe Jai (Jay Chou), com o pretexto de celebrar o feriado com a família. Porém o frio relacionamento existente entre ele e a imperatriz Phoenix (Gong Li) desmente a justificativa. Durante muitos anos a imperatriz e o príncipe Wan (Liu Ye), seu enteado, mantiveram uma ligação ilícita. Wan sente-se aprisionado e sonha em fugir do palácio com Chan (Li Man), a filha do médico imperial e seu amor secreto. Enquanto isso Jai cresce preocupado com a saúde de sua mãe e, principalmente, com sua obsessão por crisântemos amarelos. Quando o imperador sente-se ameaçado, ele transfere o médico imperial (Ni Dahong) e sua família para uma área remota do reino. Porém durante a viagem eles são atacados por assassinos, o que faz com que Chan e sua mãe (Chen Jin) retornem ao palácio.
Bastidores: -Indicado ao Oscar 2007 de MELHOR FIGURINO.
Notas da Crítica:
João Lopes, Premiere: 4/5
Pablo Villaça, Cinema em Cena: 4/5Tiago Pimentel, Premiere: 4/5
André Gordirro, Almanaque Virtual: 3/5
José V. Mendes, Premiere: 3/5
Luis Salvado, Premiere: 3/5
Rui Brazuna, Premiere: 3/5
Vitor Moura, Premiere: 3/5Rodrigo Salem, SET: 6/10
A. Pascoalinho, Premiere: 2/5
Gerard Casau, Contrapicado: 2/5
Sergi Sanchez, Contrapicado: 2/5Marcelo Hessel, Omelete: 2/5
Enrique Aguilar, Contrapicado: 1/5
Francisco Guarnieri, Paisà: 1/5
Magdalena Navarro, Contrapicado: 1/5
Mario Abbade, Almanaque Virtual: 1/5
Rodrigo Fonseca, Almanaque Virtual: 1/5
SANTOS E DEMÔNIOS
(A Guide to Recognizing Your Saints, EUA, 2007)
Direção: Dito Montiel
Elenco: Robert Downey Jr., Shia LaBeouf, Chazz Palminteri, Dianne Wiest, Rosario Dawson
Sinopse: O filme conta a história de um garoto criado em Astória, um bairro de periferia, durante os anos 90. Enquanto seus amigos vão morrendo vítimas das drogas ou na prisão, ele começa a acreditar que foi salvo de ter o mesmo destino pelos diversos e tão falados santos. Downey interpreta o personagem principal quando adulto, olhando para seu passado.
Notas da Crítica:
Marcelo Hessel, Omelete: 4/5
Alessandro Giannini, SET: 7,5/10
Miguel Barbieri Jr., Veja SP: 3/5
Neusa Barbosa, Cineweb: 3/5
Cassio Starling Carlos, Folha Ilustrada: 2/4ÍNDICE NC: 6,50/5
IMPÉRIO DOS SONHOS
(Inland Empire, EUA/ França/ Polônia, 2006)
Direção: David Lynch
Elenco: Laura Dern, Jeremy Irons, Justin Theroux, Naomi Watts, Bellina Logan, Scott Coffey, Peter J. Lucas, Ian Abercrombie, Justin Theroux, Neil Dickson, Diane Ladd e William H. Macy
Sinopse: Um dia depois de ter recebido a misteriosa visita de uma vizinha cheia de perguntas e afirmações enigmáticas do tipo "e se amanhã fosse hoje ?", a atriz de Hollywood Nikki Grace, casada, recebe através de seu agente a confirmação de que foi aceita para interpretar a infeliz Susan "Sue" Blue, protagonista de "On High in Blue Tomorrows", o novo filme do diretor Kingsley Stewart.
Nikki não desiste do papel mesmo quando descobre que está no remake de um filme polonês chamado "47", que nunca foi finalizado porque os atores principais da produção original se apaixonaram e acabaram assassinados com uma chave de fenda oxidada. Quando se envolve com o galã sedutor Devon Berk, que interpreta Billy, seu parceiro na trama, o mundo de Nikki é invadido por sensações de medo, fantasia, ficção, realidade, sonhos, visão, cinema, assim como os passados, futuros e identidades dos protagonistas ganham lugar para que os personagens se movam livremente na narrativa
LINK PARA OS MELHORES FILMES DE 2007
ENCANTADA
(Enchanted, EUA, 2007)
Direção: Kevin Lima
Elenco: Amy Adams (Giselle), Patrick Dempsey (Robert), James Marsden (Príncipe Edward), Timothy Spall (Nathaniel), Rachel Covey (Morgan), Susan Sarandon (Rainha Narissa)
Sinopse: Giselle (Amy Adams) é uma bela princesa que foi recentemente banida por uma rainha malvada de seu mundo mágico e musical. Com isso ela agora está na Manhattan dos dias atuais, um local completamente diferente de onde vivia. Logo ela recebe a ajuda de Robert (Patrick Dempsey), um advogado divorciado por quem se apaixona. Só que Giselle já está prometida em casamento para o príncipe Edward (James Marsden), que decide também deixar o mundo mágico para reencontrar sua amada.
Notas da Crítica:
Suzana Amaral, Guia da Folha: 3/4
Roberto Sadovski, SET: 7/10
Alysson Oliveira, Cineweb: 3/5
Erico Borgo, Omelete: 3/5
Laís Catassini, Cinema com Rapadura: 6/10
Christian Petermann, Guia da Folha: 2/4
Pedro Butcher, Guia da Folha: 2/4ÍNDICE NC: 6,07/7
HITMAN - ASSASSINO 47
(Hitman, EUA, 2007)
Direção: Xavier Gens
Elenco: Timothy Olyphant, Dougray Scott, Olga Kurylenko, Robert Knepper e Ulrich Thomsen.
Sinopse: O agente 47 (Tim Olyphant) foi criado para ser um matador de aluguel. Suas armas mais poderosas são a ousadia, assim como o orgulho e o brio que tem na execução de seu trabalho. O número 47 representa os dois últimos dígitos do código de barras tatuado em sua nuca, e é também o único nome que ele possui.Mas o dia passa a ser da caça quando 47 se vê envolvido em um golpe político. Tanto a Interpol quanto os militares russos perseguem o assassino profissional pela Europa Oriental, enquanto ele tenta descobrir quem tramou contra ele e por que estão tentando tirá-lo da jogada. E a maior ameaça à sua sobrevivência talvez sejam sua própria consciência e as emoções desconhecidas que uma garota bonita e sofrida desperta nele.
Notas da Crítica:
Carlos Eduardo Corrales, Delfos: 3,5/5
Marcelo Forlani, Omelete: 3/5
Rodrigo Carreiro, Cine Reporter: 1/5Miguel Barbieri Jr., Veja SP: 0/5
Saturday, October 27, 2007
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CLÉBER EDUARDO, da Revista (eletrônica) Cinética:
"Em busca da memória ameaçada
No encerramento de Cine Jornada (média de Octavio Bezerra), o documentarista Vladimir Carvalho, em tom de luto, reage ao enterro de uma geração (Glauber Rocha, Joaquim Pedro de Andrade, Leon Hirzsman). Pergunta de que valeram suas mortes? O questionamento em si mesmo é um tanto ortodoxo, dando a entender que, apesar de suas obras fundamentais, esses artistas “fracassaram” em seus projetos políticos, derrota prontamente estendida a toda geração de realizadores pós-anos 50. O prestígio internacional não foi suficiente para superarem o risco de esquecimento e invisibilidade de seus trabalhos.
Tratando-os como mártires, que sacrificaram a vida pelo cinema brasileiro e foram banidos por seus momentos históricos (os anos 80), Vladimir evidencia pelas palavras, mesmo em um filme de outro realizador, qual é sua busca no documentário: a busca do que se perdeu, dos rastros históricos, de uma memória ameaçada, sempre em forma de testemunhos, de testemunhas – método que vemos, com maior ou menor êxito, em Conterrâneos Velho de Guerra e Barra 68. Haveria nessa proposta um tanto da motivação dos documentários do israelense Amos Gitai, que, como ele próprio definiu, tem uma relação de arqueologia com os sinais de outros momentos de seu país? Em alguma medida pelo menos.
Não é outra a disposição de Carvalho em O Engenho de Zé Lins, se não a da investigação do passado, de sua reorganização e de seu entendimento a partir dos testemunhos de quem o viveu. Como se percebe logo nos primeiros minutos, quando, em uma escola na Paraiba chamada José Lins do Rego, pergunta-se aos alunos se leram alguma linha do autor de Fogo Morto e Pedra Bonita, temos a constatação de uma esclerose cultural. Essa passagem é imediatamente posterior a imagens de imortais da Academia Brasileira de Letras, em uma celebração do centenário do escritor, quando frases/slogans de elogios e consagração do homenageado ocupam a tela em forma de letreiros, a nos lembrar de frases/slogans presentes em cartazes de filmes. Promocional? Sim. Promove-se Zé Lins em um momento (o oficial/institucional), para depois detectar seu desaparecimento (ao menos de nosso caldo cultural). Há uma dialética entre essas duas seqüências, e esse esquecimento verificado entre os alunos é amplificado por Ariano Suassuna, que aponta o descaso dos críticos com a obra dele (Zé Lins), não sem um tom de injustiça histórica na reação a essa promoção do apagamento.
Portanto, o que se busca, sempre, é a preservação. Vladimir Carvalho já nos deu provas, com mais ou menos êxito, de que trata as histórias, a História e a memória como organismo vivo, não como peças de um museu empoeirado. O Zé Lins evocado pelos entrevistados parece estar logo ali, à nossa frente, comportando-se exatamente como seus próximos o descrevem. Temos uma sucessão de entrevistas com conhecidos e amigos do escritor, todas concentradas em um biografismo anedótico, em algumas suposições psicologizantes, que tanto narram situações insólitas do performático protagonista ausente como se apoiam em momentos traumáticos de sua vida para explicar a personalidade. Surgem desses depoimentos uma verdadeira aula sobre quem foi Zé Lins, sobre sua relação quase de idolatria com Gilberto Freire (que dizia tê-lo formatado), sobre seu temperamento impulsivo e sobre sua angústia, com a revelação de passagens inusitadas de sua trajetória – as mais espirituosas geradas por sua paixão cega pelo Flamengo, que o levou a queimar uma camisa de Jair da Rosa Pinto, quando, ao abraçá-lo no vestiário após uma derrota do rubro-negro, percebeu como estava seco o uniforme do craque.
Propondo um diálogo na montagem entre as entrevistas, ricas imagens de arquivo, o único registro sonoro do escritor (uma entrevista em Lisboa em 1956), fragmentos de narração de Othon Bastos (como a voz encenada de Zé Lins) e fotografias de grande efeito plástico/dramático, Vladimir Carvalho foge do mero entrevistismo e, quando o utiliza, não o faz de uma maneira burocrática e meramente funcional. Uma entrevista com Suassuna, por exemplo, é interrompida pela som de um avião. Imagem da aeronave voando. Voltamos para as entrevistas, mas, nesse retorno, Suassuna conta um caso, ocorrido em um teatro, que nada tem a ver com Zé Lins. Ficamos a ouvir a saborosa narratividade verbal do carismático dramaturgo, que se desvia do filme e cria imagens cinematográficas com as palavras, abrindo um link dentro do documentário para fazer seu próprio filme, generosamente aceito por Carvalho.
Imagens produzidas por palavras, aliás, são constantes em O Engenho de Zé Lins. Em sintonia com o rigoroso romancista do qual falam, os entrevistados (sobretudo Suassuna e Tiago de Melo) bailam com as palavras e flanam na oratória. Eles tecem suas colocações de improviso como se estivessem arquitetando uma obra literária, cultivando o tempo das frases, as inflexões da voz, sempre em busca do melhor efeito narrativo de seus testemunhos. É impagável o relato de Tiago de Melo sobre uma partida entre Flamengo e Racing no Maracanã, presenciada por Zé Lins, no qual o poeta faz as pausas certeiras, senhor do suspense, ilustrado segundo depois por imagens do jogo ao qual se refere. Montagem e retórica verbal, nesse momento específico, resultam em uma lua de mel. Da linguagem, no caso. Essa lua de mel não é onipresente em O Evangelho de Zé Lins, seja por conta do início encenado e narrado de maneira um tanto frágil, seja por conta de alguns testemunhos menos preocupados com a oratória – mas, de forma geral, temos um projeto de audiovisual empenhado em construir memória, sem esquecer de que cinema é articulação de informações visuais e sonoras. Bom retorno, Vladimir. "
CARLOS ALBERTO MATTOS, do Doc Blog de O Globo:
"A palavra engenho tem duplo significado no filme de Vladimir Carvalho. É o engenho de açúcar paraibano, visto aqui como lugar de origem da personalidade de José Lins do Rêgo; e também sinônimo para o talento com que o escritor engendrou vida e invenção em sua obra. Mas o título ressoa ainda para além de tudo isso. Nele se vê um amálgama do cineasta e seu personagem. Ali está também o engenho de Vladimir.
Embora em idades diferentes, ambos dividiram o cenário de Itabaiana, interior da Paraíba. Zé Lins foi o ídolo da infância de Vladimir, a ponto de o menino se demorar diante do espelho arrumando o cabelo à moda do escritor. Não que essas coisas sejam contadas no filme, mas ecoam no sentimento que comanda muitas cenas. Vladimir debruça-se sobre a vida de Zé Lins como se ele fosse um parente, um tio admirável. E complexo.
A (psic)análise do personagem pontua momentos marcantes como a primeira e traumática visão da morte durante uma encenação da Paixão de Cristo; o tiro acidental que causou a morte de um coleguinha e virou o grande segredo da família; a "amizade amorosa" com Gilberto Freyre (foto à esquerda) , decisiva para sua formação intelectual; a paixão pelo Flamengo que, segundo Carlos Heitor Cony, seria a grande contrapartida de sua imensa melancolia. Vladimir toma uma atitude deflagradora ao colocar esses temas em discussão junto a parentes, amigos e colegas de ofício, assim levando à descoberta de dimensões novas na pessoa e na obra de Zé Lins. Se todo doc biográfico brasileiro tivesse essa envergadura e semelhante coragem, estaríamos no melhor dos mundos.
O Engenho de Zé Lins não se prende a dispositivos nem coleiras metodológicas. Investe em pequenas encenações, depoimentos cativantes como os de Ariano Suassuna e Edson Neri da Fonseca, e materiais de arquivo usados com parcimônia e editados com precisão de relojoeiro. A infância do escritor é fartamente ilustrada com cenas do clássico Menino de Engenho, de Walter Lima Jr., o que leva a um desdobramento emocionante. O ex-ator mirim Sávio Rolim reaparece no cenário do engenho Itapuá, hoje arruinado e ocupado pelo MST. O próprio Rolim é uma ruína humana, às voltas com próteses esotéricas pelo corpo e problemas mentais já difundidos pelo curta O Menino e a Bagaceira, de Lúcio Vilar. A seqüência no Itapuá é o clímax de uma meditação sobre a morte e o fim de um tempo, temas caros tanto a Zé Lins quanto a Vladimir.
Numa das cenas do filme de Lima Jr., o personagem Papa-Rabo é atazanado pela criançada escondida no mato. Uma das vozes que se ouve é de Vladimir Carvalho, gravada num estúdio em 1965. Essa voz atravessa mais de 40 anos para juntar-se agora à voz do entrevistador cálido mas incisivo, uma das assinaturas do grande documentarista. As imagens de São Miguel Arcanjo e da fabricação da rapadura, que volta e meia aparecem nos seus filmes, também marcam presença nesse trabalho em que Vladimir redesenha a imagem de José Lins do Rêgo e, ao mesmo tempo, se mira em seu espelho. "
ANA MARTINELLI, do site Cineclick:
"Um menino observa uma encenação da crucificação de Cristo. Pequena dose de ficção, pretexto para o olhar curioso e impressionado do menino em relação ao mundo a ser descoberto. Assim, fresco e curioso é o olhar de Vladimir Carvalho sobre a vida e obra do escritor José Lins do Rego.
Como que para provar sua tese e introduzir o público sobre a necessidade de resgatar a trajetória do Menino do Engenho (romance que deu a Zé Lins notoriedade), o documentarista pergunta a alguns jovens da cidade natal do escritor:
- Você conhece José Lins do Rego? Não.
- Você já leu alguma coisa de José Lins do Rego? Não.
- Qual é o nome do seu colégio? José Lins do Rego.
Com esse gancho, o diretor constrói um retrato apaixonado e carinhoso de um mundo que não existe mais, senão no imaginário e no registro literário. A infância daquele menino do Engenho Tapuá (Paraíba) é retomada durante toda a narrativa do filme, parecendo ser a chave para se entender o surgimento do universo de Zé Lins.
O longa pontua os depoimentos dos moradores mais antigos, que viveram o começo da decadência do Engenho Tapuá, a belíssimas imagens do processo artesanal da confecção da rapadura. Também mostra e reconstrói o passado com cenas do filme O Menino do Engenho (1965), de Walter Lima Jr., e intervenções ficcionais.
O próprio diretor se coloca como personagem, trazendo coincidências na história de ambos, conterrâneos que se mudaram da Paraíba e construíram suas vidas em outros Estados, o que não os impediu de manter aquele universo vivo e revisitá-lo em suas obras.
José Lins do Rego, junto a outros escritores como Raquel de Queiroz, Ariano Suassuna, Gilberto Freyre, para citar alguns, fez parte de um efervescente período da literatura brasileira e nordestina, que ficou conhecido como o ciclo da cana-de-açúcar. Para entender o que eles representam para a cultura brasileira, o diretor traz à discussão sobre o homem Zé Lins depoimentos de amigos próximos e admiradores de sua obra, como os próprios Suassuna, Raquel de Queiroz e ainda Carlos Heitor Cony, Hélio de Mello e sua filha mais velha, Elizabeth.
O documentário possui linguagem bem simples e familiar ao grande púbico, às vezes até didática, sem que isso prejudique seu ritmo fluído. A sensibilidade do diretor é refletida na mistura de recursos ficcionais a imagens de arquivos, fotografias, trechos de outros filmes e entrevistas. Até mesmo quando revela coisas mais íntimas da vida e personalidade de Zé Lins, Vladimir Carvalho não deixa a trama cair na euforia e melancolia latentes, como no depoimento de Tiago de Mello, poeta de quem o escritor foi guru, que encerra o filme. De forma tocante e sem pudores, Mello fala sem censura e detalhadamente sobre os últimos e dolorosos momentos antes da morte do amigo.
"Um grande humanista que soube criar tipos humanos incríveis", diz Cony em seu depoimento. Esta, com certeza, é a chave de todo o documentário que incita o espectador, após assisti-lo, a ir para casa ler e se embrenhar no universo de Zé Lins."
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