Sunday, March 13, 2011

TOP 2 CRÍTICA 2011

1) Trabalho Interno
Trecho da Crítica de Carlos Alberto Mattos, para o site Criticos.com.br:

"(...)As cenas de abertura sugerem o estilo de Oliver Stone: Wall Street goes pop. Mas não vai muito longe a impressão. Logo em seguida somos assoberbados por uma pletora de cabeças falantes, gráficos, fac-símiles de jornais e documentos, créditos de identificação – e ainda as legendas da tradução, muitas vezes impressas em branco sobre fundo branco, ou seja, null. É árdua a tarefa de ver Inside Job. Por vezes você vai sentir saudade dos alívios cômicos e da escala “humana” de Michael Moore. Mas Ferguson não quer entreter nem fazer cinema criativo. Cientista político, matemático e especialista em tecnologia da informação, tendo prestado consultoria à Casa Branca e a empresas como Apple, Xerox e Motorola, sua carreira no cinema começou em 2008 com No End in Sight, doc sobre o envolvimento dos EUA na guerra do Iraque. Seus dois filmes, portanto, são dossiês destinados a “fechar” capítulos da história americana. Por isso são pesados, sóbrios e detalhistas.
Trabalho Interno tem uma pegada didática. Pretende explicar as raízes da crise, lá no governo Reagan, e a rede de interesses que se armou ao longo dos governos Clinton e Bush, unindo o sistema financeiro com as esferas governamentais. A escalada da especulação, a bolha dos empréstimos imobiliários, o jogo das grandes corporações financeiras com o dinheiro dos clientes, o enriquecimento estapafúrdio dos altos executivos, tudo é dissecado em flashes, falas editadas no essencial e pequenos blocos de narração. Mas acompanhar o ritmo das informações e a trama das relações é um desafio para o espectador que desconheça os personagens e o idioma economês. Ferguson não facilita as coisas em prejuízo da fidelidade aos pormenores.
Os personagens são muitos – e muito mais seriam se todos os figurões tivessem concordado em dar entrevista para o filme. A sucessão de cartelas informando quem não topou participar funciona como acusações implícitas: quem se omite tem culpa no cartório. Na virtual impossibilidade de seguir o fluxo de tantas acusações e defesas vacilantes, resta-nos aceitar a argumentação indignada do diretor e sua câmera-dedo apontada para os vilões. No fundo, é mais uma questão de confiar no cineasta que de entender e posicionar-se.
Boa parte dos fatos já haviam sido abordados, com igual apetite e um pouco menos de aridez, em Capitalismo: uma História de Amor, de Michael Moore. Mas há pelo menos dois pontos de vantagem para Ferguson. Um deles é a inclusão da academia na rede de falsificações e consultorias forjadas. Segundo o filme, professores das universidades de Harvard e Columbia contribuíram decisivamente para sustentar as mistificações da bolha e o status quo do neoliberalismo predatório. O outro ponto é a decepção com o governo Obama, que não implementou as reformas prometidas e cedeu cargos públicos às velhas raposas do sistema anterior. A nota de esperança que encerrou vários docs americanos recentes, o de Moore inclusive, é severamente desmentida em Trabalho Interno. Houve mesmo quem interpretasse a narração de Matt Damon (um eleitor Democrata) como um sinal de que Hollywood estaria abandonando Obama.
A boa causa e o caráter direto do filme não lhe garantem, porém, uma qualidade cinematográfica distintiva. A retórica de Ferguson baseia-se em falas, dados e imagens-padrão de reportagens sobre corporações. Planos aéreos de Nova York indicam a amplitude da abordagem, torres simbolizam poder e cobiça, fachadas envidraçadas sugerem impessoalidade. E ainda um elemento dramático que se impõe a cada dez minutos: a porta giratória. Ela representa o movimento contínuo, a roda da fortuna que acolhe como expulsa, o equipamento que engole e expele seres humanos das entranhas do dragão financeiro. Tudo bem. Só que depois da quinta ou sexta porta giratória, você começa a achar que sobra razão mas falta cinema em Inside Job."
Notas da Crítica:
Filippo Pitanga, Almanaque Virtual: 5/5
Neusa Barbosa, Cineweb: 5/5
Ritter Fan, Metido a Crítico: 9/10
Rodrigo de Oliveira, Paradoxo: 89% de 100%
Emilio Franco Jr., Cineplayers: 6/10

2) Tio Bonmee, que pode recordar suas Vidas PassadasTrecho da crítica de Cid Nader, para o site Cinequanon:

"(...)Da Tailândia, Apichatpong, parece cada vez mais reconfirmar que anda inventando um novo cinema (mesmo filmando, editando, e vendo seus filmes exibidos na tela grande), onde as coisas fluem de forma natural demais, sem que sustos possam ser algo a ser considerando como agressivo e incomum ao ser humano, onde animais falam com homens, e de onde fantasmas podem surgir de repente, para conversar amigavelmente com alguém próximo em vida, já que a vida não se encerra numa cápsula/corpo, que derroca definitivamente quando falece. Lá da Tailândia, com inegáveis atenções dedicadas e retiradas e referenciadas do que de melhor se fez e faz no ocidente (basta ver, sempre e sempre, a enormidade de países envolvidos nas produções de seus filmes, o diretor de nome quase impronunciável (mas que de tanto apego e admiração pelos mais cinéfilos das bandas de cá poderia ouvir esse seu nome falado em rodinhas sem nenhum titubeio) foi introduzindo suas coisas, pelo seu cinema: seu budismo, seu modo de relatar um setor do mundo onde a imigração ilegal importa tanto quanto os espíritos vagantes ou as reencarnações em animais, onde os tempos de guerra com os comunistas (ou ao lado) deixaram marcas que são processadas em outras ondas de preocupação; ou ainda quando entrega uma região com pés na modernidade (estranhando e se lambuzando dela, readaptando-a, reinventando – luzes artificiais de Natal durante cerimônias fúnebres ou em locais de karaokê, lanternas de luz branca, daquelas chinesas, para iluminar uma mesa onde encontros insólitos, para nós, ocorrem...), enquanto um futuro monge reclama não da pobreza de seu claustro, mas do fato de ainda não poder usar seu celular ou o computador como os mais antigos fazem.
'Tio Boonmee...' é mais um passo do diretor em direção da consolidação de um cinema único, que flui naturalmente (como já disse) – naturalmente até demais -, mas onde a celebração à boa execução se revela a cada passagem, em cada plano-sequência, nos modos calmos de interpretações, na calma na hora de utilização da música, no modo de suas lentes verem e captarem suas florestas (cenário de seus filmes que tanto é emblemático pela potência que emana de suas entranhas, pela beleza hipnótica que remete à criação – nesse, especificamente, há lá dentro dela a caverna-útero onde Boonmee morre/renasce, como um significado para lá de evidente de quão no interior de cada um ela está, e de quão dentro dela todos se sentem), onde costuma reiniciar as histórias que conta (quando as pessoas falam com bichos, quando as pessoas são reencarnadas em bichos), após o espectador estar certo de que já dominava o ambiente.
Talvez o ritmo possa ser comparado ao da meditação, mas Apichatpong não deixa, o tempo todo, de lembrar que esse local essencialmente espiritual está embebido de mundo. Tal fluidez (meditativa) vem sendo executada com rigor desde o início de sua carreira (confesso que não vi os seus trabalhos voltados à vídeo-arte – talvez me indispusesse com tais atos) e o prazer de retornar para mais um filme dele chega a ser inexplicável. A falta de seus filmes causa algo como sintoma gerado por abstinência, e cada vez fica mais fácil “compreendê-lo”: ou estamos nos acostumando (como nos acostumamos com culinárias exóticas, aos poucos), ou ele anda um tanto mais concedente – mas de nenhuma forma poderia dizer que enfraquecido. Um cinema conceitual (poderia ser); um cinema criador de escola (deveria ser); um cinema que não deixa de encarar tudo com humor afinado (as situações que ele cria: a reunião na mesa, o tio Boonmee se expressando em francês, o sobrinho monge pedindo para tomar um banho antes de ir um lanche - se bem que, nesse momento do filme, vidas passadas ganham imagens e dúvidas), fazendo mais concretas as certezas de que tenta imiscuir suas e nossas tradições num clima de naturalidade narrativa.
E, especificamente aqui, há momentos de quase encantamento, de quase captura, como quando o macaco-fantasma surge anunciando quem é, e contando sua história; ou quando o fantasma da mulher cuida de Boonmee no caminho do final carnal (num momento lindo em que são observados por uma família de macacos-fantasmas); ou na singeleza de, num campo quente, mel sendo experimentado diretamente do favo... Quem não conferir – e nem estou exigindo que seja o melhor filme do mundo, nem mesmo o melhor dele – estará perdendo um bom trecho que os bondes da histórias costumam percorrer. "
Notas da Crítica:
Bruno Marques, Almanaque Virtual: 5/5
Leonardo Luiz Ferreira, Almanaque Virtual: 5/5
Neusa Barbosa, Cineweb: 5/5
Geo Euzebio, Cineplayers: 10/10
Cassio Starling Carlos, Guia da Folha: 4/4 ("assombroso")
Inácio Araujo, Guia da Folha: 4/4 ("de imagens inegavelmente fortes")
Leonardo Cruz, Guia da Folha: 4/4 ("fantasmas! Chewbacca!! Monga!!!)
Pedro Butcher, Guia da Folha: 4/4 (filme dos mistérios e maravilhas")
Gilberto Silva Jr., Contracampo: 4/4
Leonardo levis, Contracampo: 4/4
Marcelo Hessel, Omelete: 5/5
Kenia Freitas, Cineplayers: 9,5/10
Vlademir Lazo, Cineplayers: 9/10
Daniel Dalpizzolo, Cineplayers: 8/10
Heitor Augusto, Cineclick: 4/5
Carlos Alberto Mattos, Almanaque Virtual: 4/5
Daniel Schenker, Almanaque Virtual: 4/5
Mario Abbade, Almanaque Virtual: 4/5
Suzana Uchôa Itiberê, Preview: 8/10
Christian Petermann, Guia da Folha: 3/4 ("decifra-me ou te entedio")
Marina Person, Guia da Folha: 3/4 ("belo e inclassificável")
Alice Furtado, Contracampo: 3/4
Calac Nogueira, Contracampo: 3/4
João Gabriel Paixão, Contracampo: 3/4
Airton Shinto, Shintocine: 7/10
Amir Labaki, Guia da Folha: 2/4 ("um quê de Macunaíma")
Suzana Amaral, Guia da Folha: 2/4 ("para amar ou detestar. Um risco")
Pablo Villaça, Cinema em Cena: 2/5

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