Sunday, March 20, 2011

TOP 3 CRÍTICA 2011

O diretor Charles Fergunson e a produtora Audrey Mars, responsáveis por Trabalho Interno, vencedor do Oscar de Melhor Documentário em Longa-Metragem.
1) Trabalho Interno
Crítica de Neusa Barbosa, do site Cineweb:

"Se alguém procura um mapa da crise econômica mundial que, em 2008, sacudiu mercados, sugou trilhões de dólares em riqueza, causou a falência de grandes instituições financeiras, o desemprego de milhões de pessoas e uma instabilidade sem precedentes em vários países, ele está no documentário Trabalho Interno, de Charles Ferguson.
Premiado com o troféu de melhor roteiro de documentário pelo Sindicato dos Roteiristas dos EUA e com o Oscar de documentário, Trabalho Interno chama a atenção, desde o início, pela solidez de sua pesquisa. Lidando com um tema complexo, diversas entrevistas e materiais de arquivo, consegue ser claro e incisivo ao mesmo tempo.
Autor de outro documentário igualmente contundente, No end in sight (2007), que dissecou as falsas razões do governo George W. Bush para a guerra do Iraque, o intelectual, ex-palestrante de universidades como Berkeley e o MIT (Instituto de Tecnologia de Massachussets), e milionário da indústria do software desde os anos 1990, Ferguson mostra-se um entrevistador altamente preparado – e não raro corrosivo para desavisados, como o ex-assessor do presidente George W. Bush, Glenn Hubbard.
Conciso, didático e detalhado, o filme historia como bancos norte-americanos promoveram agressivamente o financiamento e refinanciamento de hipotecas, mesmo para aqueles que claramente não podiam pagá-las, ao mesmo tempo em que especulavam em cima desse não-pagamento, com lucros astronômicos – caso do grupo Magnetar, de Chicago.
Enquanto crescia a bolha da ciranda financeira, lobistas se empenhavam junto a políticos para que não se aprovasse legislação dificultando seus movimentos - mantendo a desregulamentação iniciada nos anos 1980, com o presidente republicano Ronald Reagan, mantida pelo democrata Bill Clinton, na década de 90.
Não por acaso, negaram entrevistas ao cineasta alguns dos arquitetos e defensores do modelo especulativo, que finalmente quebrou bancos como Goldman Sachs e Lehman Brothers – caso dos ex-secretários do tesouro Larry Summers, Robert E. Rubin, Henry M. Paulson e Timothy F. Geitner, vistos apenas em imagens de arquivo.
É ouvido também um dos poucos a ter enfrentado os mega-especuladores, o ex-procurador geral e depois governador de Nova York, Eliot Spitzer.
Por muitas razões, Trabalho interno é um filme realisticamente sombrio. Primeiro, porque denuncia que os mentores da alucinada ciranda especulativa fizeram-no deliberadamente – o que constitui crime, ainda não punido. Segundo, porque vários desses arquitetos da bancarrota alheia continuam assessorando o governo atual de Barack Obama. Terceiro, porque a universidade, que deveria oferecer um contraponto crítico, foi cooptada, com vários de seus eméritos professores aceitando cargos em conselhos diretores das empresas especuladoras, como consultores do governo (caso de Glenn Hubbard) ou palestrantes pagos regiamente com milhares e milhares de dólares (como John Y. Campbell, de Harvard)."
Notas da Crítica:
Filippo Pitanga, Almanaque Virtual: 5/5
Neusa Barbosa, Cineweb: 5/5
Roger Ebert, Sun Times: 10/10
Ritter Fan, Metido a Crítico: 9/10
Rodrigo de Oliveira, Paradoxo: 89% de 100%
Emilio Franco Jr., Cineplayers: 6/10

O sul-coreano Lee Chang-dong, diretor de Poesia
2) Poesia
Crítica de Marcelo Hessel, do site Omelete:

"Em Sol Secreto, o filme anterior do diretor sul-coreano Lee Chang-dong, a protagonista passa por provações diversas e não parece encontrar, na realidade ao seu redor, motivos para superá-las. Uma personagem religiosa diz que é importante ver Deus nas pequenas coisas, como num raio de sol, mas a protagonista responde: "Um raio de sol é apenas um raio de sol".
Lee volta a testar a dor de uma mulher em Poesia (Shi, 2010), o seu longa mais recente, prêmio de melhor roteiro no Festival de Cannes. Desta vez, porém, um raio de sol não é só um raio de sol. Filme sincero que parte de uma trapaça, Poesia força a personagem a encarar o mundo com outros olhos e, por extensão, impõe também ao espectador esse novo olhar.
A trapaça, implícita no título, é deixar claro, para quem não estava reparando, que há poesia em tudo aquilo que enxergamos. Mija (Yoon Jeong-hee) é uma avó que já passou dos seus 60 anos e agora procura coisas com que se ocupar. Ela se matricula em um curso de poesia. Estuda aplicadamente, mas não consegue escrever. Quando seu professor diz que há muito a se versar sobre uma mera maçã, por exemplo, Mija passa minutos observando uma, antes de descascá-la meio desapontada com a inspiração que não vem.
A realidade tratará de dar à senhora material para sentir... A avó descobre que o neto que ela sustenta abusou sexualmente, com outros amigos de escola, de uma menina que acaba de se suicidar. Mija precisa juntar dinheiro para calar a mãe - dizem os pais dos outros garotos - mas o que ela ganha cuidando de um velho sequelado por um derrame não é suficiente. E as más notícias estão só começando.
Poesia é um melodrama em acordo com o formato que o gênero adotou na segunda metade do século passado no cinema: histórias prioritariamente femininas, de desarranjo adulto diante do tempo e do mundo em constante mudança. Nos melodramas, questões cotidianas, como não ter dinheiro para pagar alguma coisa, se revestem de importância vital não só para o personagem mas também para o espectador. Revestem-se, por assim dizer, de poesia.
O filme de Lee Chang-dong seria, portanto, um Dançando no Escuro do bem. Ambos lidam com as convenções do melodrama de forma metalinguística, mas Poesia não sobrecarrega conscientemente sua heroína de desgraças para sabotar o gênero de dentro para fora, como faz Lars von Trier, e sim para devolver ao melodrama o que suas cenas mundanas têm de transcendentais (se o melodrama hoje precisa desse serviço de restauração, já é outra questão).
O fato é que o diretor tem sensibilidade para os detalhes, não importa se for só um jogo de badmington. O texto premiado em Cannes é mesmo redondo - Mija está ao tempo todo se questionando o que é poesia, e descobrindo a valiosa lição de que poético não é necessariamente sinônimo de belo - e a atuação de Yoon Jeong-hee ajuda a elevar Poesia, um filme que no papel parece bater numa nota só mas na tela se engrandece."
Notas da Crítica:
Cassio Starling Carlos, Guia da Folha: 4/4 ("beleza pura")
Christian Petermann, Guia da Folha: 4/4 (delicadeza memorável")
Inácio Araujo, Guia da Folha: 4/4 ("acha-se, não se procura")
Leonardo Cruz, Guia da Folha: 4/4 ("Lee é um dos melhores cineastas da Ásia")
Suzana Amaral, Guia da Folha: 4/4 ("belo filme, agrada aos poucos")
Roger Ebert, Sun Times: 8,75/10
Alysson Oliveira, Cineweb: 4/5
Celso Sabadin, Cineclick: 4/5
Filipe Codeço, Almanaque Virtual: 4/5
Marcelo Hessel, Omelete: 4/5
Marina Person, Guia da Folha: 3/4 ("versos delicados")
Vlademir Lazo, Cineplayers: 7/10
Amir labaki, Guia da Folha: 2/4 ("roteiro maior que o filme")
O cineasta Apichatpong Weerasethakul recebe a Palma de Ouro no Festival de Cannes por Tio Bonmee, que pode recordar suas Vidas Passadas
3) Tio Bonmee, que pode recordar suas Vidas Passadas
Crítica de Inácio Araujo, Blog Uol Cinema:

"Estou longe de ser um fanático de Apichtapong Weerasethakul, cujo “Tio Boonmee” está em cartaz no Brasil e que garnhou a Palma de Ouro em 2010. Também, devo admitir, sou apenas um pobre ocidental. Não morro por nenhum desses chineses e assemelhados que apareceram nos últimos anos. È terreno em que meu amigo Cassio Starling se move melhor do que qualquer outro. Tirando o King Hu e uns caras de Hong Kong, ali da tradição do kung-fu, quem me impressionava mesmo era o Edward Yang, que morreu desgraçadamente jovem. Mas pode ser que eu já esteja ficando meio velho e, quando isso acontece, a gente vai também se tornando desconfiado, porque a indústria (a de autores inclusive) precisa inventar nomes novos.
Nos filmes de Apichtapong convém entrar na ponta dos pés. Tudo ali convida o espectador ao respeito – não a esse respeito que pede “a arte”, e sim aos seres que lá se encontram. Quem são eles? Podem ser animais, árvores, pássaros, homens, fantasmas, macacos-fantasmas, vento, sombras, cavernas.
E se podem ser chamados de “seres” é porque de certa forma todos existem numa igual dimensão. Como se o cinema de Apichtapong, como já se disse, rompesse com a tradição antropocêntrica. O homem é aqui apenas uma parte das coisas, e entretém com a natureza, com as lendas, com o tempo e os objetos em geral uma relação perfeitamente horizontal.
O encanto de “Tio Boonmee que Pode Recordar Suas Vidas Passadas” pode ser resumido em apenas uma cena. Aquela em que está sentado à mesa com a cunhada e, na outra extremidade, surge o fantasma de sua mulher. Um rápido espanto. Nada demais: como se um conviva familiar tivesse aparecido inesperadamente.
Pouco depois, outra presença igualmente marcante entra em cena vindo de outra dimensão: o filho fotógrafo que, após copular com um macaco fantasma, se vê transformado em um deles. Estranho personagem, com ar da Fera de “A Bela e a Fera” e olhos vermelhos de raio laser. E todos conversam em torno da mesa.
O assunto em torno do qual tudo gira é a morte de tio Boonmee, cujos rins já não funcionam. Mas o aspecto anedótico, a “história” quase não tem importância, já que o homem que vemos integra-se à natureza, ao passado, aos demais seres. Não há balançar das folhas ao vento que não deixe a impressão de que tudo vive, de que tudo vibra.
A partir dessa estrutura tão pessoal de filme fantástico, “Tio Boonmee” se permite absorver digressões, como a notável lenda da princesa, que ao ver sua imagem refletida na água, enxerga sua beleza passada – porque o que se vê na água é ilusão. Mas a lenda (com desdobramentos fascinantes) impõe a pergunta: e o que não será ilusão? O que distingue o imaginado do acontecido? Ou, para ficar com uma imagem que “Tio Boonmee” desenvolve: o que distingue a parede de uma caverna da imagem noturna do céu?
E o que é o céu, aliás? Num dos momentos mais memoráveis do diálogo, Huay (a mulher de Boonmee) esclarece, respondendo a uma indagação do marido: “o céu é superestimado”.
Me parece muito difícil dizer se este filme tailandês mereceu a Palma de Ouro ou, mais ainda, se permanecerá ou vai virar uma dessas obras-primas que ninguém se conforma em rever a que se referia Borges. É inegável, no entanto, a originalidade e a força das imagens. Apichtapong é, na pior das hipóteses, um nome a considerar entre os cineastas que se afirmam no século 21."
Notas da Crítica:
Bruno Marques, Almanaque Virtual: 5/5
Leonardo Luiz Ferreira, Almanaque Virtual: 5/5
Neusa Barbosa, Cineweb: 5/5
Geo Euzebio, Cineplayers: 10/10
Cassio Starling Carlos, Guia da Folha: 4/4 ("assombroso")
Inácio Araujo, Guia da Folha: 4/4 ("de imagens inegavelmente fortes")
Leonardo Cruz, Guia da Folha: 4/4 ("fantasmas! Chewbacca!! Monga!!!)
Pedro Butcher, Guia da Folha: 4/4 ("filme dos mistérios e maravilhas")
Gilberto Silva Jr., Contracampo: 4/4
Leonardo levis, Contracampo: 4/4
Marcelo Hessel, Omelete: 5/5
Kenia Freitas, Cineplayers: 9,5/10
Vlademir Lazo, Cineplayers: 9/10
Daniel Dalpizzolo, Cineplayers: 8/10
Heitor Augusto, Cineclick: 4/5
Carlos Alberto Mattos, Almanaque Virtual: 4/5
Daniel Schenker, Almanaque Virtual: 4/5
Mario Abbade, Almanaque Virtual: 4/5
Suzana Uchôa Itiberê, Preview: 8/10
Christian Petermann, Guia da Folha: 3/4 ("decifra-me ou te entedio")
Marina Person, Guia da Folha: 3/4 ("belo e inclassificável")
Alice Furtado, Contracampo: 3/4
Calac Nogueira, Contracampo: 3/4
João Gabriel Paixão, Contracampo: 3/4
Airton Shinto, Shintocine: 7/10
Amir Labaki, Guia da Folha: 2/4 ("um quê de Macunaíma")
Suzana Amaral, Guia da Folha: 2/4 ("para amar ou detestar. Um risco")
Pablo Villaça, Cinema em Cena: 2/5

No comments: