(Atonement, Inglaterra, 2007)
Direção: Joe Wright
Roteiro de Ian McEwan e Christopher Hampton. Elenco: Keira Knightley (Cecilia Tallis), James McAvoy (Robbie Turner), Romola Garai (Briony Tallis - 18 anos), Saoirse Ronan (Briony Tallis - 13 anos), Vanessa Redgrave (Briony Tallis - idosa), Brenda Blethyn (Grace Turner), Juno Temple (Lola), Alfie Allen (Danny Hardman), Nonso Anozie (Frank Mace), Benedict Cumberbatch (Paul Marshall), Michelle Duncan (Fiona), Daniel Mays (Tommy Nettle), Gina McKee (Enfermeira Drummond), Jérémie Renier (Luc Cornet), Charlie von Simson (Jackson), Felix von Simson (Pierrot), Harriet Walker (Emily Tallis), Ben Harcourt (Jackson - 13 anos), Jack Harcourt (Pierrot - 13 anos)
Sinopse: Inglaterra, 1935.
Filha caçula de uma família aristocrática, Briony Tallis tinha treze anos e já demonstrava uma imaginação fértil e disposição para datilografar, o que a tornava uma promissora escritora. Naqueles dias Briony dedicava-se a uma peça teatral intitulada "Anabella em Apuros", que ela pretendia encenar no dia da visita de seu irmão, Leon, à residência de campo da família.
No dia dos ensaios, no entanto, os gêmeos Pierrot e Jackson e a prima Lola, que seriam os integrantes do elenco, rebelam-se por causa do calor e decidem ir brincar na piscina, deixando Briony sozinha.
Aborrecida com a infantilidade dos primos, Briony observa uma abelha tentando entrar pelo janelão de vidro da sala e acaba reparando, mais no fundo, perto do chafariz, na presença de Cecília, sua irmã mais velha, e Robbie Turner, o filho da governanta, num momento de certa intimidade. Na verdade Briony não entendeu direito o que viu, mas a cena já disparou na sua cabecinha de imaginação fértil e não tão inocente quando se poderia supôr muitas e perigosas sementinhas de pensamento.
Esse é o primeiro de uma série de incidentes que terminam por levar Robbie a ser preso após ser acusado por Briony de molestar sexualmente a prima dela, Lola.
Quatro anos após ser preso, Robbie está no Norte da França na frente de combate ao lado das tropas aliadas. Robbie e Cecília, agora enfermeira-chefe de um hospital militar, trocam correspondências e sonham em um dia se encontrar numa velha cabana branca nas margens de um lago plácido.
Briony levaria por anos na sua consciência um pesado fardo de culpa por ter um dia separado Robbie e Cecília.
Bastidores: Desejo e Reparação foi indicado ao Oscar 2008 nas categorias Melhor Filme, Melhor Atriz Coadjuvante (Saoirse Ronan), Melhor Roteiro Adaptado (Christopher Hampton), Melhor Fotografia (Seamus McGarvey), Melhor Figurino (Jacqueline Durran) e Melhor Trilha Sonora (Dario Marianelli).
Opiniões dos Críticos:
DIEGO BENEVIDES, do site Cinema com Rapadura:
"(...)É bizarro ter que descrever impressões de “Desejo e Reparação” que apenas podem ser sentidas. O filme consegue ser uma mistura de espetáculo visual proporcionado pelo diretor Joe Wright com a narrativa arrebatadora do roteiro. É uma produção que não tem medo de se expor e de provocar. A primeira parte da história é marcada pela leveza do romance, até este ser atrapalhado pela obsessão de Briony. Os personagens são bem justificados e colocados em situações que geram interesse do espectador. Quando a guerra chega, o filme não decai do objetivo principal, que é o romance impedido entre os protagonistas. É possível ver a guerra, as conseqüências dela, sem deixar de humanizar os soldados que estão no conflito, mas que possuem coisas bem mais importantes fora dali. Na terceira parte, a Reparação, somos alvo da crueldade das ironias da vida, e compactuamos o arrependimento e as tentativas de Briony reparar o que fez.
Em todos os momentos, Joe Wright é espetacular. Após o debut com o razoável e sonolento “Orgulho e Preconceito”, o diretor é ousado desde o início. Ele sabe muito bem o que retirar de cada situação, sem perder o crescimento de seus personagens. Wright parece fotografar todos os momentos em cena como uma relíquia, dando significado a olhares intensos ou desejos íntimos dos personagens. Quando vai para a guerra, ele ensina cinema ao compor um plano de mais de cinco minutos sem um único corte, com muitos figurantes em harmonia e que registra as conseqüências de uma guerra para quem estava envolvida nela. Quando precisa fazer o desfecho do filme, Wright tira o fôlego com a tristeza dos personagens e com a palidez de suas atitudes. Como se não bastasse a mão abençoada com que agarrou o projeto, ele ainda tem na cabeça todas as formas de como o filme seria montado, ciente das idas e vindas da história, da montagem impecável e da sonorização ímpar.
A equipe técnica não falha um momento sequer. A trilha sonora composta por Dario Marianelli mescla tensão, paixão e traição em diversos momentos. Os instrumentais são tão bem ajustados que poderia tirar a atenção da trama, mas Wright só permite isso quando é a intenção. Na maior parte da história, vemos uma harmonia incrível da trilha sonora e das captações de som ambiente com a fotografia impecável de Seamus McGarvey. Por mais que em algum momento haja excesso, a capacidade em criar um resultado final indiscutível faz de “Desejo e Reparação” uma obra altamente competente.
O trabalho com o elenco é outra responsabilidade com que Wright se ateve. A intimidade que conquistou com Keira Knightley, que também protagonizou “Orgulho e Preconceito”, fez com que a atriz conseguisse um resultado um pouco mais maduro do que no filme anterior. Ainda não sendo uma atuação excepcional, ela se mostra espontânea e sarcástica, além de retratar bem o que o amor perdido fez com ela. James McAvoy certamente despontará sua carreira, já que mostra uma versatilidade incrível, indo desde o apaixonado Robbie, ao Robbie destruído. Entretanto, o maior destaque fica com as três intérpretes de Briony.
A primeira, Saoirse Ronan, constrói a personagem no primeiro ato, fundamental para que as conseqüências de sua paixão doentia sejam demonstradas. Ronan é de uma expressividade incrível, sem deixar a inocência de lado. Mesmo assim ela adere uma crueldade em potencial, talvez por ser jovem ou talvez por cada um ter seu lado maligno dentro. Romola Garai assume o papel aos 18 anos e o mantém com graciosidade. Neste momento, vemos o paradoxo das duas fases de Briony, agora como estagiária em enfermagem que precisa lidar com os feridos da guerra. Em um determinado momento, Briony se desespera com os feridos e Wright faz questão de mostrar o quanto aquilo a abala. É como se ela sentisse não só a culpa de ter destruído o relacionamento da irmã e mandado Robbie para a guerra, mas como se ela tivesse causado a própria guerra. A terceira é interpretada pela experiente Vanessa Redgrave, que tem pouco tempo em cena, mas é responsável pelo mais intenso momento do roteiro. (...)."
RODRIGO CARREIRO, Cine Reporter:
"(...) Para começo de conversa, “Desejo e Reparação” é um brinco cinematográfico. A estética, por si só, já seria suficiente para valer uma conferida atenta. Mas a beleza cinematográfica da direção de arte, dos figurinos, da fotografia e da música não é gratuita. Serve à narrativa, como acontece nos melhores filmes. Tome como exemplo o fantástico plano-seqüência de cinco minutos que divide o filme em dois. A tomada sem cortes mostra Robbie (James McAvoy, excelente), um dos personagens principais, cruzando a praia francesa onde as forças britânicas acabam de desembarcar, num momento crítico da Segunda Guerra Mundial (1940). Ele é um soldado que não deseja estar ali. Enquanto cobre uma distância de uns 300 metros, Robbie passa por um coral de militares que entoa uma canção de esperança.
De repente, a leve melodia que compõe a trilha sonora e acompanha a trajetória do personagem, ao fundo, se eleva e une ao coro dos soldados. As músicas se fundem por alguns instantes, até que Robbie siga o seu caminho. A edição de som complementa o prodígio do trabalho de câmera. Espectadores desatentos podem achar que o plano-seqüência é gratuito, um malabarismo inútil feito para ganhar prêmios. Mas se a cena fosse decupada da forma tradicional, com cortes a cada cinco ou seis segundos, a platéia seria privada de compreender a extensão da paixão que Robbie nutre por Cee (Knighley, boa). Sim, porque o jovem soldado encara no passeio horrores inomináveis – mortos, feridos, bêbados de prazer e medo, destruição por todo lado – sem prestar a mínima atenção. Os horrores da guerra não se comparam ao tumulto interior, ao caos que está dentro dele. A impossibilidade da paixão dói muito mais em Robbie do que a guerra. O plano-seqüência exprime visualmente este conceito.(...)
A fotografia de Seamus McGarvey é excepcional, e não apenas por causa do já citado plano-seqüência. Observe como o fotógrafo manipula com firmeza e sabedoria as múltiplas fontes de luz natural nas tomadas interiores, usando inclusive a luz de vela (sempre complicada de fotografar) para conseguir um efeito que é ao mesmo tempo romântico e misterioso. Há uma cena noturna, externa, também fotografada de maneira magistral. Claro que ele tem a ajuda de uma direção de arte suntuosa, e de belos figurinos – o vestido verde utilizado por Keira Knightley na cena-chave não apenas renega um chavão do uso de cores em cinema (o vermelho como a cor da sedução), mas também realça o turbilhão de emoções da personagem, ao colocá-la claramente num patamar emocional diferente de todos os demais que fazem parte da cena.
A trilha sonora de Dario Marianelli também tem muito pontos positivos, pois utiliza de forma criativa ruídos naturais para dar um toque original à percussão. O uso constante do som de teclas de uma máquina de escrever, dando ritmo à melodia, também serve à narrativa – é uma pista da surpreendente guinada radical que a história dá no terceiro ato, que finalmente esclarece o grande tema do filme: a culpa, e a tentativa de usar o poder da arte para, de alguma forma, tentar reparar erros cometidos no passado. Joe Wright cria uma tensão ambivalente entre ficção e realidade para abordar este tema, que já havia sido magnificamente explorado pela linda imagem silenciosa do soldado amargurado no cinema, tornando insignificante pela gigantesca imagem do beijo apaixonado de uma projeção do filme “Cais das Sombras”, de Marcel Carné (1938).
É provável que os espectadores mais tradicionais se decepcionem com o final metalingüístico de “Desejo e Reparação”, mas é exatamente este final, original e surpreendente, que faz o filme crescer silenciosamente na cabeça de quem o viu. Até porque o segundo ato, que deixa de lado o terceiro vértice do triângulo amoroso para se concentrar na paixão frustrada de Robbie e Cee, havia antes diluído o tema principal, adicionando um punhado de melodrama banal na receita e se afastando do estudo sobre a culpa que é o romance de Ian McEwan. Tivesse conseguido impor mais distância ao clichê do romance impossível em tempo de guerra (história que Hollywood adora desde “Casablanca”), Joe Wright teria feito um filme perfeito. "
Sunday, January 27, 2008
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